quarta-feira, 21 de julho de 2010

Por que os brasileiros não visitam a Amazônia? (parte 3/3)

Depois de escrever sobre as características físicas e a ocupação humana da Amazônia, hoje postarei a situação atual e também algumas conclusões e perspectivas.

SITUAÇÃO ATUAL


Mais de 20% do ecossistema Amazônia foi destruído nos últimos 40 anos. Esse processo segue em ritmo crescente. O que mais ameaça a Amazônia hoje são as queimadas, a pecuária extensiva, o agronegócio com a monocultura de soja para exportação, a exploração predatória das madeiras, a ocupação concentrada e desordenada das terras, a construção de imensas hidrelétricas para abastecer indústrias eletrointensivas.

Um pequeno punhado de capitalistas, brasileiros e estrangeiros, se beneficia dessa devastação, enquanto a maioria convive com o aumento da fome, miséria e desemprego, no campo e nas cidades.

A floresta em pé, a biodiversidade, os povos indígenas, os caboclos, os quilombolas, as comunidades tradicionais, tornam-se empecilhos ao capitalismo.

Modelos de intervenção equivocados, governos autoritários a serviço da classe dominante, monopólio dos meios de comunicação, violência dos capitalistas, impunidade, fundamentalismo religioso, invasão de empresas e governos estrangeiros, ações danosas de algumas ONG’s e fundações, são fatores aliados dos que ameaçam os povos da Amazônia e o próprio ecossistema.

Diversos tipos de unidades de conservação protegem, pelo menos no papel, cerca de 5,6% da área do ecossistema Amazônia. Embora nesse percentual não estejam incluídas as áreas indígenas, muitas delas se sobrepõem com as unidades de conservação, causando conflitos de interesses. Elos de ligação entre as unidades de conservação, e também teoricamente protegidos, os corredores ecológicos representam importantes zonas de conservação da biodiversidade.


CONCLUSÕES

A vocação da Amazônia é ser floresta. Qualquer atividade empreendida na região deve pressupor a floresta em pé. Isso não significa mantê-la necessariamente intocada, mas construir relações harmônicas entre o homem e a natureza, garantindo-lhe um uso sustentável. Propostas, sugestões e exemplos bem sucedidos, ainda que isolados, não faltam.

As futuras decisões só farão sentido se respeitados os direitos, as necessidades e a autonomia dos índios, caboclos, comunidades tradicionais. São eles os povos dotados de sabedoria acumulada e as principais interessadas na correção dos rumos.

Pouco ou nada melhorará se não forem alteradas as relações sociais existentes na região e no país. Enquanto prosseguirem o acúmulo de capital em detrimento da maioria, o processo de recolonização do país, a exploração econômica e opressão política do povo, não teremos avanços significativos.

O povo brasileiro pode e deve assumir a responsabilidade de salvar a Amazônia. É preciso romper esse circulo vicioso de desinteresse e desconhecimento. Fala-se pouco e conhece-se quase nada da região. Os brasileiros devem discutir, estudar, visitar, denunciar, se envolver, assumir a Amazônia brasileira. Mesmo porque, não faltam empresas e governos estrangeiros interessados, sobretudo os já instalados impunemente na região.

Mas não bastam ações individuais. Devemos priorizar a auto-organização e a mobilização social dos brasileiros. Ações locais e especificas precisam se articular com lutas mais amplas que questionem o modelo geral de dominação. Somente assim superaremos a apatia geral, salvaremos os ecossistemas e construiremos uma sociedade na qual haja harmonia nas relações entre os seres humanos e nas relações entre os seres humanos e a natureza.

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Por que os brasileiros não visitam a Amazônia? (parte 2/3)


Hoje postarei as características físicas e a ocupação humana da Amazônia. Na próxima postagem será a vez da situação atual e algumas conclusões.

CARACTERÍSTICAS FÍSICAS


O Ecossistema da Amazônia brasileira, exceto as zonas de transição ao Cerrado e à Caatinga, possui cerca de 3,7 milhões de quilômetros quadrados, 43% do território do Brasil, mais de 11 mil quilômetros de fronteiras internacionais, ocupando os estados de Rondônia, Acre, Amazonas, Roraima, Pará, Amapá e partes dos estados do Maranhão, Tocantins e Mato Grosso.

A Amazônia não é homogênea geograficamente. Inclui diversos tipos de relevos, solos, florestas, cerrados, várzeas, campos e zonas de transição. As matas de terra firme ocupam 96% da área. As florestas ombrófilas, densas e abertas, predominam em quase 80% da área do ecossistema sobre os campos e cerrados. Embora apresente altas temperaturas e umidade, típicas de regiões equatoriais, ela conta com variações climáticas, indo de regiões muito úmidas, praticamente sem períodos de seca, até as com estações secas longas e definidas.

Os milhares de rios e afluentes que cortam a Amazônia formam a maior bacia hidrográfica do planeta. Eles concentram perto de 20% das águas doces superficiais e líquidas da Terra. O potencial mineral da região ainda não foi completamente estudado e avaliado.

O diversificado solo amazônico caracteriza-se pela baixa fertilidade em 89% da área. A biodiversidade prospera principalmente devido à reciclagem dos nutrientes pelos seres vivos, vegetais e animais, próximos à superfície. O frágil equilíbrio do ecossistema garante a auto-sustentação pelas diversas cadeias alimentares que reaproveitam tudo, pelos ciclos da água, carbono e nitrogênio. As árvores contam com raízes pouco profundas, mais horizontais que verticais. Quando ocorrem desmatamentos, o solo fica exposto às chuvas e ao sol, provocando endurecimento do solo, erosão e remoção da fina camada de matéria orgânica. Em outras palavras, o ecossistema sobrevive somente com a floresta em pé.

Região de maior biodiversidade do planeta, porém pouco conhecida, a Amazônia contém mais de 25% das variedades de espécies vivas do planeta, distribuídas irregularmente e até endemicamente. Estimativas conservadoras dos números de espécies catalogadas apontam 1,5 milhão de vegetais, 3 mil de peixes, 163 de anfíbios, 500 de répteis, 950 de pássaros, 311 de mamíferos. Esses números crescem constantemente em função de novas pesquisas.


OCUPAÇÃO HUMANA

Contrariando as lendas, a Amazônia não era e nem é desabitada. Há pelo menos 12 mil anos existem vestígios de presença humana na região. Somente no vale do rio Amazonas, antes da invasão dos europeus no século XVI, viviam cerca de 1 milhão habitantes, distribuídos em mais de mil etnias e línguas diferentes, em complexas estruturas sociais e em total harmonia com a natureza. Era a região mais populosa do Brasil. Quase todos foram dizimados, pelas armas, doenças ou missões religiosas. Com eles perdeu-se a sabedoria adquirida em milhares de anos. Restam hoje apenas 210 mil sobreviventes em 150 povos distintos, 30% dos quais em áreas urbanas. A maioria encontra-se em situação desesperadora.

Estabelecidos nas várzeas dos rios, os caboclos ou ribeirinhos, os quilombolas, herdaram parcialmente os conhecimentos dos povos indígenas. Vivem integrados com a natureza e retiram dela o necessário para sobrevivência, sem destruí-la.

Durante séculos, depois do genocídio dos povos nativos pelos invasores europeus, a situação pouco mudou na Amazônia. A partir do fim do século XIX, com o ciclo da borracha, os olhos se voltaram para a região. Mesmo assim apenas parcialmente. Somente após o golpe civil-militar de 1964 passam a surgir estratégias de intervenção massiva, sempre sob o falso pressuposto de ocupar imensas áreas desabitadas. As conseqüências da entrada do capitalismo na Amazônia mostraram-se catastróficas.

Em quarenta anos a população da Amazônia multiplicou por quatro, atingindo 20 milhões e tornou-se majoritariamente urbana. Estima-se que mais de 1 milhão de pessoas migraram para a região nas últimas três décadas.

A grilagem de terras garantiu a invasão de milhões de hectares pelo agronegócio e grandes latifundiários, avançando sobre terras devolutas e pequenas propriedades familiares. A concentração da terra na mão de poucos deixa um rastro de sangue pelos constantes assassinatos de trabalhadores rurais ou os empurra para a periferia das cidades. Esses novos habitantes, vindo de outras regiões do país e mesmo estrangeiros, nada entendem da Amazônia e encaram o ecossistema original como obstáculo. As primeiras medidas para se considerarem proprietários das terras invadidas são a cerca e a derrubada da floresta.

continua...

sexta-feira, 9 de julho de 2010

Por que os brasileiros não visitam a Amazônia? (parte 1/3)

   

     Dentre os brasileiros que conseguem viajar, poucos sonham em explorar a região amazônica. Comentam a respeito, elogiam as belezas naturais, criticam o desmatamento, falam disso e daquilo, emitem opiniões, inventam mil e uma desculpas, mas não vão até lá para ver e sentir.

     O desinteresse pela Amazônia gera a ignorância. E a ignorância pela região realimenta o desinteresse.

     Enquanto isso os estrangeiros, nem todos turistas e bem intencionados, entram e saem da Amazônia em atividades lícitas e ilícitas, sem qualquer fiscalização brasileira. A invasão de madeireiras, mineradoras, pecuária extensiva, monoculturas para exportação do agronegócio, de brasileiros e estrangeiros, devastam a região em velocidade espantosa.

     Apresentarei aqui algumas informações sobre o ecossistema Amazônia visando despertar o interesse geral pela região, seja para turismo, engajamento social e político, estudos e pesquisas mais aprofundados ou simples curiosidade de cidadão.

     Nas postagens seguintes detalharei o tema por partes. Além das impressões, observações e fotos colhidas em minhas inúmeras viagens à região, utilizei como fonte de dados O livro de Ouro da Amazônia de João Meirelles Filho, além de reportagens e artigos de edições passadas do jornal Brasil de Fato e da revista Caros Amigos.

     Todas as fotos aqui exibidas são minhas.

     Vou discorrer brevemente sobre as características físicas, a ocupação humana, a situação atual e arriscarei algumas conclusões.    

     Espero contribuir para o debate e estimular mais e mais pessoas se envolverem de fato com essa delicada questão. Sugestões e comentários serão sempre bem recebidos. Só não vale a indiferença!

continua...


quarta-feira, 7 de julho de 2010

Ferréz: Cronista de um tempo ruim (Selo Povo)


Os grandes meios de comunicação adoram elogiar livros e autores de qualidade duvidosa. E se restringem, na maioria das vezes, àqueles que escrevem sempre mais do mesmo, submissos, conscientemente ou não, aos ditames do sistema.


Acabei de ler o livro Cronista De Um Tempo Ruim do escritor paulistano Ferréz, editado pela Selo Povo Editora. Não é o primeiro livro que leio do Ferréz. Já tinha admirado Capão Pecado, Manual Prático do Ódio, Ninguém É Inocente Em São Paulo, a coletânea que ele organizou com autores da Literatura Marginal, sem falar nos artigos mensais na revista Caros Amigos.

Cronista De Um Tempo Ruim reúne intensas crônicas de um escritor inconformado, revoltado, mas, nem por isso, menos poético, sobre a periferia de São Paulo. Poderia ser uma periferia de qualquer cidade grande do Brasil. É uma literatura de qualidade e sem concessões. Ferréz denuncia a miséria social, cultural e moral causada por esse sistema injusto, mantido à força pela classe dominante. Nas periferias, o governo só aparece nos camburões da polícia e na cobrança de impostos. Investimentos sociais apenas na demagogia dos discursos eleitorais.

Reproduzindo a lógica do sistema, a mídia comercial, sobretudo na programação da televisão, trata os moradores das periferias com preconceito criminoso. Encara-os sempre como bandidos ou suspeitos. Acusa-os como responsáveis pela própria pobreza. Afinal para o grande capital, a quem a grande mídia pertence e serve, as periferias não passam do resto indesejado e descartável. Só não contam que o capital criou a periferia e a usa como mão de obra barata ou quase escrava.

Cronista De Um Tempo Ruim é grande literatura. Ferréz informa, alerta, convoca ao envolvimento. Com diversos livros publicados, a literatura de Ferréz caminha ao lado das obras clássicas de Lima Barreto e de João Antonio.

Mais informações no blog da Selo Povo Editora: http://www.selopovo.blogspot.com/

Todas as fotos aqui exibidas são minhas.